quinta-feira, 25 de setembro de 2014

26º DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A

ELES VOS PRECEDERÃO DO REINO DE DEUS

Ezequiel 18,25-28 - Salmo 24(25) - Filipenses 2,1-11 - Mateus 21,28-32
 
A Eucaristia que celebramos neste “Domingo dos dois filhos”, mostra-nos que o arrependimento é a capacidade de rever nosso comportamento, para que assim possamos conservar a nossa própria vida e a vida dos outros. Neste dia da Bíblia, celebramos a Páscoa de Jesus Cristo que se manifesta em todas as pessoas e comunidades que procuram viver a obediência à Palavra de Deus.
Situando-nos brevemente
Somos desafiados na celebração de hoje a mostrar quem somos diante de Jesus e diante das pessoas. Se não assumirmos um compromisso efetivo com ele, não teremos parte no banquete do seu Reino. E humildemente nos reconhecemos na antífona de entrada da celebração: “Senhor, tudo o que fizeste conosco, com razão o fizestes, pois pecamos contra vós e não obedecemos aos vossos mandamentos”.
Ezequiel nos ensina a não culpar Deus por nossos erros. O mundo e a sociedade são o campo onde o Pai nos pede um compromisso com a justiça do Reino. Dizer sim a Deus significa fazer a vontade de Deus e ser acolhido no seu Reino.
A Páscoa semanal, vivenciada neste “domingo dos dois filhos”, nos motiva a dar graças ao Pai, por Jesus, o Filho que “humilhou-se e foi obediente até a morte, e morte de cruz”. Exaltado pelo Pai tornou-se fonte de vida e salvação para os que aceitam entrar em seu caminho.
Neste dia da Bíblia, celebramos a Páscoa de Jesus Cristo que se revela nas pessoas que procuram viver o discipulado, obedientes à Palavra de Deus. Além da Liturgia da Palavra, parte integrante da liturgia cristã e constituindo com o rito eucarístico um só ato de culto (cf. Sacrosanctum Concilium, n.56), toda a celebração, como memorial do mistério pascal de Jesus, no hoje de nossa vida, está inserida no conjunto da História da Salvação, da qual a Bíblia dá incomparável testemunho.
Recordando a Palavra
A primeira leitura está no contexto do Exílio da Babilônia. O povo acusa Deus de injusto e de agir incorretamente. Entre o povo havia a idéia de que o pecado marcava para sempre a vida e a descendência de quem pecava.
Não é uma fatalidade, nem Deus é o culpado da morte do pecador. O profeta, como porta-voz de Deus, mostra que a salvação de uma pessoa não depende de seus antepassados e parentes. O que importa é a disposição do coração no momento presente. Deus nos julga conforme o que somos hoje. Nunca é tarde para nos arrependermos, porque Deus quer a vida para todos.
O Salmo 24 (25), uma súplica de uma pessoa com bastante idade, pede duas coisas: perdão dos seus desvios na juventude e a libertação das mãos do inimigo. Recorda a Aliança com várias palavras: caminho, direito, amor e verdade, aliança, preceitos… Deus é o aliado do pobre explorado e oprimido. O salmista tem muita confiança em pedir e certeza de ser atendido, porque o Senhor é piedade, misericórdia e bondade sem limites.
Filipos, comunidade dividida, por causa do espírito de competição e egoísmo, foi a primeira cidade da Europa a receber a mensagem cristã, entre os anos 55-57. Paulo apresenta Jesus como modelo de filho fiel e obediente que se torna servo. Convida os que se dizem seguidores dele a terem “o mesmo sentimento que existe em Cristo Jesus”.
E para convencer, introduz na sua exortação um belo hino, composto naqueles anos, que era conhecido e cantado em muitas comunidades (vv. 6-11). O hino canta a história de Jesus que, encarnando-se, não perdeu a sua natureza divina; esta permaneceu como que escondida sob a forma humana que ele assumia.
O Evangelho se situa no contexto da rejeição de Jesus por parte dos chefes do povo. Ele encontra-se em Jerusalém e seu tempo está cada vez menor. Aumenta a hostilidade daqueles que rejeitam sua mensagem. A parábola dos dois filhos é simples e questionadora.
Antes de fazer sua comparação, Jesus pede a opinião de seus ouvintes. Eles mesmos vão decidir. As traduções da Bíblia, às vezes, divergem quanto ao filho que diz “sim” e ao que diz “não”. O aumento não é cronológico. O que está em jogo é algo muito profundo e permanece na vida de quem tem fé: fazer a vontade de Deus.
A dinâmica do texto leva à reflexão: conta a parábola do filho que diz “não”, mas se arrepende e vai trabalhar na vinha do Pai; e do outro filho que diz “sim, senhor” ao pai, mas não vai. Jesus pergunta quem fez a vontade do pai. Os sumos sacerdotes e os anciãos do povo dizem que é o filho que disse “não”, mas cumpriu a ordem do pai.
Jesus completa dizendo que os cobradores de impostos e as prostitutas vão preceder no Reino de Deus os chefes que não acreditaram na pregação de João Batista e no caminho de justiça que ele ensinou. O relato é sóbrio, não se dão as razões dos dois comportamentos; eles simplesmente são descritos.
As palavras de nada valem: é preciso a ação concreta, conforme o projeto de Deus. Fazendo o que Deus espera, quem é pecador torna-se justo; não fazendo, quem se considera justo torna-se pecador. Os dois filhos podem representar diversos personagens: o povo de Israel histórico, a geração do momento, os seguidores de Jesus de todos os tempos e nós que ouvimos hoje essa palavra.
Atualizando a Palavra
Somos daqueles que pensam que basta dizer: “Senhor, Senhor” para entrar no reino de Deus? Daqueles que se acomodam com formalidade e com títulos religiosos e não se esforçam na prática da justiça? Seguir Jesus repercute em nossa prática. É ela que decide o destino diante de Deus. O fazer comprova ou desmente o dizer. A pergunta de Jesus exige discernimento: qual fez a vontade do Pai?
A intenção de Jesus não é converter seus adversários, mas dizer porque são rejeitados. Ouvimos, neste contexto, uma das frases mais duras de Jesus: “Os cobradores de impostos e as prostitutas vos precedem no Reino de Deis”. Aqueles que pretendem ser perfeitos, bons observadores da lei serão antecipados no Reino por aqueles que eles julgam e condenam como os maiores violadores da lei, os pecadores públicos. A lei que Jesus exige é colocar em prática a vontade do Pai que ama toda pessoa e, em especial, os mais necessitados e desprezados.
Jesus nos ensina a reconhecer a justiça das pessoas que não tem boa fama, mas praticam a justiça. Ensina-nos a denunciar, para o bem deles e de todos que sofrem sua influência, as que têm boa fama, os considerados santos, mas que não praticam a justiça, conforme o projeto do Pai. Jesus é o Filho que diz “sim” e faz o que o Pai decidiu. Todas as pessoas que acolhem e seguem concretamente Jesus cumprem a vontade do Pai.
Ezequiel nos fala em praticar o direito e a justiça e a nos convertermos constantemente. Essa atitude julga a nossa vida. Julgar que somos “justos” é uma cegueira pessoal que faz semear dúvidas sobre a conduta e as crenças de quem é diferente de nós. Para fazermos a vontade do Pai, a Carta aos Filipenses nos mostra o caminho assumido por Jesus: “Esvaziou-se a si mesmo assumindo a condição de servo”.
Jesus deixou de lado todo privilegio. O fato de sermos cristãos de exercemos um ministério na Igreja, não deve ser motivo de elogios, de prepotência, de nos sentirmos mais e melhores que outras pessoas. É motivo sim de solidariedade, de espírito de comunhão e serviço; de um permanente processo de encarnação no mundo dos excluídos.
Ligando a Palavra com ação litúrgica
Em cada celebração, colocamos em nossos lábios muitos cantos e palavras, repetimos orações e fazemos tantos gestos. Tudo isso terá sentido e agradará a Deus como oferta bendita se for expressão de um coração orante e comprometido com a vontade do Pai.
A Palavra de Deus nos faz mergulhar em nossa fragilidade humana e nos leva a experimentar a bondade sempre fiel do Senhor que nos propõe mudança de vida e acredita em nossa conversão. Ele, porém, não se contenta que apenas o invoquemos, repetidamente: “Senhor, Senhor”.
Mais do que palavras, preces, aclamações e cânticos, liturgia é ação. Eucaristia é ação de graças, é entrega de nossa vida ao Pai, com Cristo, o Filho fiel que provou sua obediência na cruz. Com ele passamos da morte para a vida e seu Espírito é derramado sobre nós, infundindo-nos o mesmo sentimento e a prontidão para doarmos com ele a vida, para que os outros vivam.
Essa ação deve ser testemunhada no cotidiano de nossas lidas e lutas pela realização da vontade do Pai, o Reino de justiça, amor e paz a ser estabelecido, o quanto antes, entre nós. A Palavra e a confissão dos lábios tornam-se ação e gesto das mãos, com o testemunho, “cuidando cada um não só do que é seu, mas também do que é dos outros”.


terça-feira, 9 de setembro de 2014

EXALTAÇÃO DA SANTA CRUZ


A Igreja universal celebra neste domingo a festa da Exaltação da Santa Cruz.

É uma festa que se liga à dedicação de duas importantes basílicas construídas em Jerusalém por ordem de Constantino, filho de Santa Helena. Uma foi construída sobre o Monte do Gólgota; por isso, se chama Basílica do Martyrium ou Ad Crucem. A outra foi construída no lugar em que Cristo Jesus foi sepultado pelos discípulos e foi ressuscitado pelo poder de Deus; por isto é chamada Basílica Anástasis, ou seja, Basílica da Ressurreição.

A dedicação destas duas basílicas remonta ao ano 335, quando a Santa Cruz foi exaltada ou apresentada aos fiéis. Encontrada por Santa Helena, foi roubada pelos persas e resgatada pelo imperador Heráclio. Segundo contam, o imperador levou a Santa Cruz às costas desde Tiberíades até Jerusalém, onde a entregou ao Patriarca Zacarias, no dia 3 de Maio de 630. A partir daí a Festa da Exaltação da Santa Cruz passou a ser celebrada no Ocidente. Tal festividade lembra aos cristãos o triunfo de Jesus, vencedor da morte e ressuscitado pelo poder de Deus.
A leitura do Livro dos Números, (21, 4b-9), nos fala de uma cruz erguida por ordem de Deus, em determinado momento da história da salvação e que tornou-se sinal e garantia de vida para o povo de Deus a caminho. Não é difícil compreender que aquela cruz, sinal de vida e instrumento de salvação para o povo a caminho, foi somente imagem ou figura da cruz de Cristo, sinal e instrumento de vida e da salvação definitiva do novo povo de Deus a caminho. De fato, no altar da cruz, Cristo ofereceu o sacrifício único e definitivo pela salvação de todos os filhos de Deus. Além disso, a presente leitura descreve com simplicidade as principais características do relacionamento mútuo entre Deus e os homens. 
O diálogo salvífico entre Deus e os homens, é aqui apresentado com duas características básicas:Da parte de Deus: amor, perdão, compaixão, misericórdia. Mesmo depois de tamanha ingratidão demonstrada pelo seu povo, Deus acolhe a intercessão do seu servo Moisés e perdoa todos os seus filhos.Da parte do homem: a ingratidão e a insatisfação.De fato, logo depois que Deus os perdoou e interveio em favor da salvação deles, o povo revoltou-se contra Deus e por motivos tão banais, se comparados com o que Deus havia operado gratuitamente em favor de todos. O povo impacientou-se contra Deus e contra Moisés e se pôs a falar: Por que nos fizestes sair do Egito para morrermos no deserto?

Não há pão, falta água e já estamos fartos e com nojo deste alimento miserável. Com extrema rapidez o povo esqueceu os grandes feitos de Deus em favor de sua libertação e, diante das primeiras pequenas dificuldades do caminho para a vida, rebela-se contra Deus, dando uma grande demonstração de sua ingratidão para com o Deus Salvador.

A primeira vista, podemos até nos sentir encorajados a criticar a atitude ingrata do antigo povo, mas certamente encontraremos coisas muito semelhantes em nosso relacionamento pessoal e comunitário com Deus. Ele é nosso tudo. Dele recebemos todas as coisas. Desde a nossa concepção, Deus vem realizando grandes milagres em nosso favor. É muito comum esquecermos de manifestar nossa gratidão por tudo o que recebemos gratuitamente, mas com freqüência, diante das primeiras dificuldades do nosso caminho para a plenitude da vida em Deus, esquecemos toda a bondade de Deus para conosco e nos rebelamos, somos ingratos.

São Paulo em sua carta aos filipenses (2,6-11), quer mostrar-nos como foi o momento da cruz, lugar e situação em que Deus, na pessoa do Filho amado, nos deu sua maior prova de amor. Ainda que nós homens não fôssemos merecedores de nada da parte de Deus, dada nossa condição de escravos do pecado, Jesus esvaziou-se inteiramente de sua condição e humilhou-se, assumindo nossa condição humana e carregou sobre si o peso de nossos pecados, redimindo com sua cruz a humanidade decaída e restaurando em todos nós a dignidade de filhos perdida com o pecado. Naquele gesto da cruz, Jesus além de nos dar a maior prova de amor, dá o exemplo do perfeito relacionamento entre nós filhos e Deus nosso Pai: total obediência e acolhida da sua vontade; perfeito abandono e total confiança no amor misericordioso do Pai.

No Evangelho de João (3,13-17), encontraremos uma releitura, à luz de Cristo, daquela cruz erguida por Moisés no deserto e que foi sinal e instrumento de salvação para o povo de Deus a caminho. São João coloca na boca de Jesus a afirmação: "do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja levantado, para que todos os que nele crerem, tenham a vida eterna". Com estas palavras, Jesus confirma que a cruz não é um simples acidente de caminho, mas uma necessidade na vida de qualquer um de seus seguidores de todos os tempos, pois no plano salvífico do Pai, a plenitude da vida virá somente depois da cruz e da ressurreição. É preciso abraçar com coragem e dignidade a cruz de cada dia, para poder ter a esperança e um dia contemplar Deus face-a-face. Para o novo e definitivo povo de Deus, os batizados, a cruz também é sinal e instrumento de salvação. Nela, todo filho pode saciar sua sede de perdão, misericórdia e reconciliação.