Primeira Leitura: At 8,5-8.14-17
Impuseram-lhes as mãos, e eles
receberam o Espírito Santo.
A morte de Estêvão foi o estopim para que em Jerusalém
explodisse a perseguição contra os cristãos de cultura grega, à frente dos
quais estava o próprio Estêvão. Por causa dela, os fiéis se dispersaram. Lucas
vê nesse fato a chance providencial que a comunidade tem de levar o anúncio da
palavra de Deus aos que ainda não a conhecem. Se em Jerusalém o anúncio
provocou perseguição, na Samaria suscitará contentamento. Temos aqui uma das
grandes forças da palavra de Deus: a capacidade de confraternizar povos
inimigos (compare com Lc 9,51ss). De fato, judeus e samaritanos detestavam-se
mutuamente. Agora, a Samaria acolhe o anúncio da Palavra, feito por intermédio
de Filipe, um dos sete ministros (8,5; cf. 6,5).
Filipe é apresentado como modelo de evangelizador que sai de Jerusalém para
levar o testemunho a todos (cf. 1,8). Fica, assim, caracterizado o tipo da
comunidade evangelizadora: a que não põe fronteiras ao trabalho pastoral. A
missão do evangelizador é prolongamento do que Jesus disse e fez. Consta de
anúncio e de fatos. Filipe anuncia o Cristo (v. 5) e realiza milagres (v. 6).
As duas atividades estão unidas entre si. Anunciar o Cristo é já mostrá-lo
presente na ação concreta. Por isso, a pregação de Filipe é acompanhada pela
expulsão dos espíritos maus e pela cura de paralíticos e aleijados (como fez o
próprio Jesus). Em outras palavras, anunciar o Cristo é eliminar tudo o que
aliena e despersonaliza o ser humano (demônios), dando às pessoas condições
para que assumam responsavelmente a própria caminhada (cura dos paralíticos e
aleijados). O clima que esses acontecimentos suscita é o da alegria messiânica
(cf. 2,46; Lc 2,10), que contagia a quantos aceitam Jesus como o Libertador e
Senhor de suas vidas (v. 8).
A Igreja de Jerusalém toma conhecimento do que a palavra de Deus realizou
na Samaria. E envia para lá Pedro e João (v. 14). Sua tarefa é completar a
evangelização mediante a oração e a imposição das mãos. Os samaritanos recebem
o Espírito Santo. No plano de Lucas, realiza-se o Pentecostes dos pagãos (os
samaritanos eram considerados pagãos pelos judeus). O Espírito vai conduzindo a
evangelização, fazendo que muitos povos se integrem ao único povo messiânico. O
Espírito não é propriedade dos apóstolos. Estes, sim, são servos do Espírito,
pois ele os conduz e impulsiona. Assim, de acordo com At 1,8, os discípulos de
Jesus se tornam testemunhas na Judéia (Jerusalém), na Samaria e até nos confins
do mundo (o resto do livro dos Atos), pois o Espírito da Verdade (cf.
evangelho) é o dinamismo da comunidade cristã missionária.
Segunda Leitura: 1Pd
3,15-18
Sofreu a morte na sua existência
humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito.
Os vv. 13-14,
apesar de não constarem no texto lido hoje, ajudam na compreensão do contexto.
'Quem lhes fará mal, se vocês se esforçam em fazer o bem? Se sofrem por causa
da justiça, felizes de vocês! Não tenham medo deles, nem fiquem assustados'.
Pedro escreve a cristãos que sofrem (cf. II leitura do domingo passado). Os
sofrimentos daquelas comunidades da Ásia Menor tinham duas causas: em primeiro
lugar, a situação social em que viviam – eram migrantes, trabalhadores,
escravos; em segundo lugar, a luta que sustentavam – queriam que fosse feita
justiça, que seus direitos e dignidade fossem reconhecidos. Por causa disso
eram vistos como subversivos.
Pedro lhes diz
que, se sofrem por causa da justiça, são felizes (v. 14). É a concretização da
bem-aventurança anunciada por Jesus (cf. Mt 5,10). Não são bem-aventurados pelo
sofrimento em si. O sofrimento não faz ninguém feliz! São bem-aventurados por
causa da motivação profunda que anima sua luta: a justiça que visa criar o
reino de Deus, o projeto de Deus.
Pedro anima as
comunidades, dizendo-lhes que não devem ter medo dos que as consideram
subversivas e arrastam seus membros aos tribunais. Pelo contrário, devem
'santificar em seus corações o Senhor Jesus Cristo', ou seja, reconhecer de
coração (plena e absolutamente) que o único Senhor é Jesus! Essa motivação deve
estar sempre presente e animar todas as esperanças e anseios das pessoas (v.
15).
Bons modos,
respeito e consciência limpa são os instrumentos para a conquista da justiça
(v. 16a), resposta que desarma a grosseria, a violência e a corrupção dos que
fomentam a injustiça. Temos aqui o ideal da não-violência ativa (cf. Mt
5,38-40), capaz de fazer ruir a sociedade injusta (v. 16b).
A norma de
comportamento cristão é a prática de Jesus (v. 18). O justo morreu pelos
injustos, a fim de os conduzir a Deus. Contudo, a morte de Jesus não quer dizer
que a injustiça tenha vencido. Pelo contrário, da morte nasceu a vida nova do
Espírito Santo. Esse mesmo Espírito é que age agora nos fiéis, levando-os à
prática de Jesus. Fazendo o que ele fez, os cristãos oferecem sua colaboração
indispensável na construção do reino de Deus. Esse reino é o ideal proposto por
Deus, que coincide com os profundos anseios da humanidade sedenta de justiça,
liberdade e dignidade reconhecida.
O v. 17 não
pretende atribuir a Deus a vontade de fazer sofrer as pessoas. De fato, ele não
sente prazer no sofrimento humano. O próprio Jesus o demonstrou. O sofrimento
diminui o ser de Deus presente nas pessoas. Contudo, o projeto de Deus sabe
valorizar o sofrimento. Do sofrimento nasce o desejo de liberdade e vida. E
Deus o transforma em energia que supera as injustiças que o provocam.
Evangelho: Jo 14,15-21
Eu rogarei ao Pai e ele vos dará
outro Defensor.
Num contexto de ódio e de perseguição, a promessa feita por Jesus de
dar aos discípulos o Espírito da Verdade reveste-se de suma importância. Foi a
forma de protegê-los contra o erro e a mentira, ciladas montadas pelo mundo
para desviá-los do bom caminho. Sem esta ajuda salutar, com muita
probabilidade, deixar-se-iam levar pelas sugestões do falso espírito, chegando
a renegar sua condição de discípulos. Pois, enquanto o Espírito da Verdade
conduz ao Deus verdadeiro, o espírito da mentira conduz aos falsos deuses, aos
ídolos.
O Espírito é designado como Paráclito, ajudante dos discípulos de
Jesus. Assim, não seriam deixados à própria sorte, numa espécie de perigosa
orfandade. A presença do Espírito de Verdade junto deles daria continuidade à
de Jesus. Eles teriam sempre a quem recorrer, pois o Espírito estaria neles e
"com eles para sempre".
A comunidade
cristã sempre correria o sério risco de ser levada pelo espírito da mentira.
Por isso, precisava da presença constante do Espírito da Verdade para manter-se
sempre no bom caminho. Quanto maior esse risco, tanto mais necessária fazia-se
a presença desse Espírito que conduz à verdade e à vida. Ele haveria de ser uma
luz a expulsar as trevas, de modo a permitir aos discípulos caminhar com
segurança rumo à casa do Pai.
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